(Continuação da leitura do Livro "Boa Nova"
de Humberto de Campos psicografada por Chico Xavier)
De
todas as ocorrências da tarefa apostólica, os encontros do Mestre com os
endemoninhados constituíam os fatos que mais impressionavam os discípulos.
A
palavra “diabo” era então compreendida na sua na justa acepção. Segundo o
sentido exato da expressão, era ele o adversário do bem, simbolizando o termo
dessa forma, todos os maus sentimentos que dificultavam o acesso das almas à
aceitação da Boa Nova e todos os homens da vida perversa, que contrariavam os
propósitos da existência pura, que deveriam caracterizar as atividades dos
adeptos do Evangelho.
Dentre
os companheiros do Messias, Tadeu era o que mais se deixava impressionar por
aquelas cenas dolorosas. Aguçavam-lhe, sobremaneira, a curiosidade de homem os
gritos desesperados dos espíritos malfazejos, que se afastavam de suas vítimas
sob a amorosa determinação do Mestre Divino.
Quando
os pobres obsidiados deixavam escapar um suspiro de alívio, Tadeu volvia os
olhos para Jesus, maravilhado de seus feitos.
Certo
dia em que o Senhor se retirara, com Tiago e João, para os lados de Cesaréia de
Felipe,uma pobre demente lhe foi trazida afim de que ele, Tadeu, anulasse a
atuação dos espíritos perturbadores que a subjugavam. Entretanto, apesar de
todos os esforços de sua boa vontade, Tadeu não conseguiu modificar a situação.
Somente no dia imediato, ao anoitecer, na presença confortadora do Messias, foi
possível à infeliz dementada recuperar o senso de si mesma.
Observando
o fato, Tadeu caiu em sério e profundo cismar. Por que razão o Mestre não lhes transmitia,
automaticamente, o poder de expulsar os demônios malfazejos, para que pudessem
dominar os adversários da causa divina? Se
era tão fácil a Jesus a cura integral dos endemoniados, por que motivo não
provocava ele de vez a aproximação geral de todos os inimigos da luz, afim de
que, pela sua autoridade, fossem definitivamente convertidos ao reino de Deus?
Com o cérebro o torturado por graves cogitações e sonhando possibilidades
maravilhosas para que cessassem todos os combates entre os ensinamentos do
Evangelho e os seus inimigos, o discípulo inquieto procurou avistar-se
particularmente com o Senhor, de modo a expor-lhe com humildade suas idéias
íntimas.
***
Numa
noite tranqüila, depois de lhe escutar as ponderações, perguntou-lhe Jesus, em
tom austero:
–
Tadeu, qual o principal objetivo das atividades de tua vida‘?
Como
se recebesse uma centelha de inspiração superior, respondeu o discípulo com
sinceridade:
– Mestre,
estou procurando realizar o reino de Deus no coração.
–
Se procuras semelhante realidade, por que a reclamas no adversário em primeiro
lugar? Seria justo esqueceres as tuas próprias necessidades nesse sentido? Se
buscamos atingir o infinito da sabedoria e do amor em Nosso Pai, indispensável
se faz reconheçamos que todos somos
irmãos no mesmo caminho!...
– Senhor,
os espíritos do mal são também nossos irmãos? – Inquiriu admirado o apóstolo.
– Toda
a criação é de Deus. Os que vestem a turca do mal envergarão um dia a da
redenção pelo bem. Acaso, poderias tu duvidar disso? O discípulo do Evangelho
não combate propriamente o seu irmão, como Deus nunca entra em luta com seus
filhos; aquele apenas combate toda manifestação de ignorância, como o Pai, que
trabalha incessantemente pela vitória do seu amor, junto da humanidade inteira.
– Mas,
não seria justo – ajuntou o discípulo, com certa convicção – convocarmos todos
os gênios malfazejos para, que se convertessem à verdade dos céus?
O
Mestre, sem se surpreender com essa observação disse:
-
Por que motivo não procede Deus assim?...
Porventura, teríamos nós uma substância de amor mais sublime e mais forte
do que a do seu coração paternal? Tadeu, jamais olvidemos o bom combate. Se alguém te convoca ao labor ingrato da má
semente, não desdenhes a boa luta pela vitória do Bem, encarando qualquer
posição difícil como ensejo sagrado para revelares a tua fidelidade a Deus.
Abraça sempre o teu irmão. Se o adversário do reino te provoca ao
esclarecimento de toda a verdade, não desprezes a hora de trabalhar: pela
vitória da luz; mas, segue o teu caminho no rotundo atento aos teus próprios
deveres, pois não nos consta que Deus abandonasse as suas atividades divinas
para impor a renovação moral dos filhos
ingratos, que se rebelaram na sua casa. Se o mundo parece povoar-se de sombras,
e preciso reconhecer que as leis de Deus são sempre as mesmas, em todas as
latitudes da vida.
É
indispensável meditar na lição de nosso Pai e não estacionar a meio do caminho
que percorremos.
Os
inimigos do reino se empenham em batalhas sangrentas? Não olvides o teu próprio
trabalho. Padecem no inferno das ambições desmedidas. Caminha para Deus. Lançam
a perseguição contra a verdade? Tens contigo a verdade divina que o mundo não
te poderá roubar, nunca. Os grandes patrimônios da vida não pertencem às forças
da Terra, mas às do Céu. O homem que dominasse o mundo inteiro com a sua força,
teria de quebrar a sua espada sangrenta, ante os direitos inflexíveis da morte.
E, além desta vida, ninguém te perguntará pelas obrigações que tocam a Deus,
mas, unicamente, pelo mundo interior que te pertence a ti mesmo, sob as vistas
amoráveis de Nosso Pai.
“Que
diríamos de um rei justo e sábio que perguntasse a um só de seus súditos pela
justiça e pela sabedoria do reino inteiro? Entretanto, é natural que o súdito
seja inquirido acerca dos trabalhos que lhe foram confiados, no plano geral,
sendo também justo se lhe pergunte pelo que foi feito de seus pais, de sua
companheira, de seus filhos e irmãos. Andas assim tão esquecido desses
problemas fáceis e singelos?
Aceita
a luta, sempre que fores julgado digno dela e não te esqueças, em todas as
circunstâncias, de que construir é sempre melhor.”
Tadeu
contemplou o Mestre, tomado de profunda admiração. Seus esclarecimentos lhe
caíam no espírito como gotas imensas de uma nova luz.
–
Senhor – disse ele – vossos raciocínios me iluminam o coração; mas, terei
errado externando meus sentimentos de piedade pelos espíritos malfazejos? Não
devemos, então, convocá-los ao bom caminho?
–
Toda intenção excelente – redarguiu Jesus – será levada em justa conta no céu,
mas precisamos compreender que não se deve tentar a Deus. Tenho aceitado a luta
como o Pai me envia e tenho esclarecido que a cada dia basta o seu trabalho.
Nunca reuni o colégio dos meus companheiros para provocar as manifestações dos
que se comprazem na treva; reuni-os, em todas as circunstâncias e oportunidades,
suplicando para o nosso esforço a inspiração sagrada do Todo-Poderoso. O
adversário é sempre um necessitado que comparece ao banquete das nossas
alegrias e, por isso, embora não o tenha convocado, convidando somente os
aflitos, os simples e os de boa vontade, nunca lhe fechei as portas do coração,
encarando a sua vinda como uma oportunidade de trabalho, de que Deus nos julga
dignos.
O
apóstolo humilde sorriu, saciado em sua fome de esclarecimento, porém,
acrescentou, preocupado com a impossibilidade em que se via de atender
eficazmente à vítima que o procurara:
–
Senhor, vossas palavras são sempre sábias; entretanto, de que necessitarei para
afastar as entidades da sombra, quando o seu império se estabeleça nas
almas?!...
–
Voltamos, assim, ao início das nossas explicações – retrucou Jesus – pois, para
isso, necessitas da edificação do reino no âmago do teu espírito, sendo este o
objetivo de tua vida. Só a luz do amor divino é bastante forte para converter
uma alma à verdade. Já viste algum contendor da Terra convencer-se sinceramente
tão só pela farsa das palavras do mundo? As dissertações filosóficas não
constituem toda a realização. Elas podem ser um recurso fácil da indiferença ou
uma túnica brilhante, acobertando penosas necessidades. O reino de Deus, porém,
é a edificação divina da luz. E a luz ilumina, dispensando os longos discursos.
Capacita-te de que ninguém pode dar a outrem aquilo que ainda não possua no
coração. Vai! Trabalha sem cessar pela tua grande vitória. Zela por ti e ama a
teu próximo, sem olvidares que Deus cuida de todos.
***
Tadeu
guardou os esclarecimentos de Jesus, para retirar de sua substância o mais
elevado proveito no futuro.
No
dia seguinte, desejando destacar, perante a comunidade dos seus seguidores, a
necessidade de cada qual se atirar ao esforço silencioso pela sua própria
edificação evangélica, o Mestre esclareceu, com seus apólogos singelos, como se
encontra dentro da narrativa de Lucas:
–
“Quando o espírito imundo sai do homem, anda por lugares áridos, procurando e
não o achando diz: – Voltarei para a casa donde saí; e, ao chegar, acha-a
varrida e adornada. Depois, vai e leva mais sete espíritos piores do que ele,
que ali entram e habitam; e o último estado daquele homem fica sendo pior do
que o primeiro”.
Então,
todos os ouvintes das pregações do lago compreenderam que não bastava ensinar o
caminho da verdade e do bem aos espíritos perturbados e malfazejos; que
indispensável era edificasse cada um a fortaleza luminosa e sagrada do reino de
Deus, dentro de si mesmo.
Comentário
do poster: Jesus nos ensina que antes de tentarmos mudar o nosso próximo que se
encontra em caminho equivocado, devemos trazer o amor em nossos corações. Acrescenta
que somente palavras não mudarão o íntimo desequilibrado desses irmãos necessitados.
Quando Tadeu pergunta por que não conseguiu expulsar o demônio daquela pobre
demente, Jesus assevera que necessitamos construir o Reino dos Céus em nosso
espírito. Ele assegura que só desta forma teremos autoridade moral para auxiliar
essas almas sequiosas de paz.
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